sábado, 31 de outubro de 2015

Dona Maria, esta de Minas

Dona Maria – esta de Poções – nos acolheu como da outra vez.
- Vem comer, tomar banho, tomar café - chamava ela.
A gente ia.
- Parece filha distante, agora tenho mais um netinho – dizia.




Dona Maria – esta de Minas – estava guardada em casa na chegada. Chegamos com sanfona enquanto as/os moradoras/es se escondiam dentro das portas e janelas a espiar.
- Quem vem lá?
- Não sei, fecha a porta por garantia.

Quando reconheci casa e chamei na porta veio vulto.
- Aqui é a casa da Dona Maria? Seu Lau?
Era.
- Lembra de mim?
As portas e portões e janelas se abriram todos em seguida:
- A moça! A palhaça!

A apresentação de Brasil Pequeno foi ali, mais tarde. Foi chegando vizinha, vizinho, que coisa mais linda, olha ali Dona Ibilina, Dona Bil...! Gente a se emocionar e eu a me emocionar com as gentes.
Depois teve mais conversa com Dona Maria – esta – a elogiar apresentação.
- Aquela apresentação daquela vez foi bonita, mas esta... eu gostei mais! Bom demais ver amizade nossa crescendo, se realizando, voltando pra ver nóis...!






Bom demais foi rever acolhida, carinho, vidas que seguem a brotar poesia em cotidiano. A inspirar vida, arte, um atrelar de andanças.

Fez calor muito, fez sacudir de estrada... no entanto, fez coração implodir em gratidão. Canção de encontro; vislumbre de troca.

Fotografias por Nathália Miranda

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Povoado Poções, Minas Gerais


Chove no sertão.
Feito trégua, fiapo de rio.
Chove pouco, marcha lenta... mas chove.
Povo de cá bem sabe de chuva pouca, sertão. Barragem baixa, sol ligeiro, falta de plantação. Povo de cá acostumou com secura, com água miúda, com silêncio de céu.
Agora chove pouco, mas chove.
Vem feito benção, esta água a cair
len-ta-men-te
va-ga-ro-sa-men-te
feito carinho em abraço.

A inundar o nariz de cheiro de terra que agradece o céu: chove. Pouco. Mas chove.

Agora parto para escola – dar oficina, trocar, mais apresentações. Daqui a pouco, início da tarde, partimos para outro local: daqui de Minas Gerais vamos para Bahia.

Tão certo que é sol voltar a rachar terra

é a gente a voltar a trilhar chão.















Fotografias por Nathália Miranda

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Dona Bil, Ibilina




Encontramos ela: a Dona Bil, Ibilina.
Estava lá na igreja, a rezar. Feito tempo traçado em silêncio, o terço enrolado em seus dedos finos e longos. Ouviu som de sanfona na rua e veio ver – isso me disse depois. Estava lá, sozinha, na igreja. Veio.  A senhora lembra de mim? Olha, que lembro... lembro! A menina das apresentação! – me nomeou.
Veio ela com seus 91 anos. Feito tempo. Feito brecha de asfalto, ruga de chão, raiz de vento. Veio a Dona Bil, Ibilina. ´´Cê voltou, menina? Tá é mais bonita, mais muié!´´ - dizia.
Disse que sim. Que havia voltado em agradecimento, gratidão pelo encontro de 6 anos atrás. Disse eu ainda que vim a mostrar mais coisas que fiz: bonecos miúdos de homenagem distante. Mostrei menina. E depois, sem titubear, mostrei a boneca dela: Dona Bil. Falei: fiz de uma senhora que conheci há alguns anos, em um lugar feito esse, em um olhar feito esse. Ela me olhou, estendeu braço pra boneca que dançou. Sorriu. Mirou fundo no meu olho e nos comunicamos em silêncio e suspiro.
Valentim ali ao lado, Laura e Nat atrás.
Aqueles minutos para mim duraram anos, sigo até agora lá: encostada na cerca da igreja, frente à senhora Bil, Ibilina. Com seu terço na mão, seu tempo no olho, seu sorriso. Sigo lá, sigo aqui, sigo.

Se a gente não é feito de emoção eu não sei mais pelo que se há de viver. 

Fotografias por Nathália Miranda

domingo, 25 de outubro de 2015

nem tudo..

nem todas as lacunas são preenchidas
nem todos os sentires são ditos
nem todo olhar tem-se registrado

nem toda respiração, infunda
nem toda vibração, soprada
resta pouco para eu não querer mais nada
bem pouco, quase nada, quase nada...

a estada inesperada em terra paulista
o aguardar com vinil de Bethânia 
os discos a colorir o vinho-doce-vinho
bem pouco, bem pouco, quase nada...

e nem tenho pressa no hoje
e do ontem um dia bom, e basta
quase nada, o bem pouco..
e tem-se tanto no silêncio, no nada.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Para Carmem Parlatore


Ela me deu um carimbo.
Mas foi bem mais.
Ela me deu tanto carinho
que transbordei.
Feito água de chuva que no chão mostra o céu, quando eu disse que estava em Campinas ela veio.
Trouxe o carimbo;
Trouxe bolo de cenoura para o Timtim;
Trouxe seu olho lindo e brilhante a reluzir em Tempo.

Durou pouco o encontro
(pensando em tempo de relógio)
Mas bem mais durou
(pensando em tempo de profundidade, de marca funda, saudade).

Nossa alma de andarilha se encontrou no caminho.
Reconheci ali – naquele olho, naquele carimbo esculpido à mão, naquela risada -um profundo querer bem, quase que transcendental (ancestral?)
feito coisa de mundo todo.

Minha alma que roda roda peão de destino
Mostra estrada que geme em murmúrio e festa
E eu bailo.
Bailo este encontro
este carimbo
este olho que brilha brilha brilhante
feito coisa de sempre mais.




quinta-feira, 22 de outubro de 2015

[mensagem recebida]

Tenho tanto a falar, e tão pouco.
Aí abro meu e-mail e leio isso. Sério. Gratidão. E eu não vou falar mais nada...



Detalhes da Mensagem:
Name Juliana
Subject Filha da Marisa, Neta de Maria, Sobrinha do Betinho
Message Olá Genifer! Nesse último final de semana estive com minha família, em Mogi das Cruzes. Sou neta da D.Maria, sobrinha do Betinho e filha da Marisa. Em nosso almoço de domingo minha avó e minha mãe me contaram emocionadas sobre a sua volta, acompanhada de Tintim. Passaram um longo tempo falando sobre você, sua arte, taleto, persistência, bondade, coragem, criatividade, sensibilidade e tantas outras coisas lindas que me disseram sobre você, seu filho Valentim e sua família da estrada. Intrigada com um trabalho tão bonito, corri na internet buscar mais informações sobre vocês. Cá estou , encantada e emocionada, assim como eles. Minha família realmente possui personagens incríveis da vida. E me encantou como você, em tão pouco tempo conseguiu captar a essência de cada um. "sorriu como quem sabe que é arteira, menino que brinca com fogo", essa é minha avó, agora com quase 82, mas com essência de menina travessa. Passei para conhecer mais sobre seu trabalho (desde ontem de noite estou fuçando, blogs, site, vídeos no youtube), mas também para lhe agradecer o olhar sensível que teve sobre eles, você os fez sentirem-se especiais. Continue emocionando todos aqueles que cruzarem seu caminho, com essa arte tão linda que faz e com esse olhar sensível sobre o outro. Um abraço apertado,
Juliana Obs: Se um dia vier a Brasília já tem uma amiga por aqui.
Você tem uma nova mensagem:
Enviado em: 3 November, 2015
Fotografia por Nathália Miranda

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Mogi das Cruzes

Tanto calor.
O corpo mesmo a pedir repouso.
Após tanta viagem
mais oficinas mecânicas
ajustes e consertos
chegamos em Mogi das Cruzes.
E fomos ao encontro dela: da Dona Maria, do fusca, de São Paulo.

Por sorte em caderno antigo havia um endereço que, posto em GPS, ficou fácil.
- Vire-à-di-rei-ta.
Batemos palmas:
- Ôh, de casa!
Nada. Ninguém. Será que ainda mora aqui?





Depois o perguntar pela vizinhança.
- Dona Maria? Mora ainda aí, sim.
Aguardar.
E depois o saber que chegará tarde, pelas 21h ou 22h, que foi jogar o bingo dela.

Dona Maria (do fusca) chegou mesmo tarde, de carona (sem fusca).
- É que me roubaram – disse – tem uns 2 meses.
Falou sentida. Disse ainda ter a janela do carro (aquela, caída em visita outra). Mas o fusca, este, se foi.

Se foi também há uns 2 anos o marido: Seu Gordo.
Lembro bem dele – da leveza e doçura que carregava.
Se foi.

Ela ficou.

E ficou cheia de energia, alegria, que a vida não está aí pra doer.
Em reencontro cheio de recordações passado ligeiro feito calor a brotar em gotículas no peito, a apresentação teve gosto de festa infantil. Doce doce!

Recompensador
Carinhoso

(Re)encontro.














Fotografias por Nathália Miranda
Xícaras (detalhe da apresentação, parceria) por Carol W